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segunda-feira, julho 11, 2011
Aula 12 do Curso Intensivo de Rock: Rhythm & Blues
Até a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o mais importante celeiro de blues era a região do Delta do Mississipi.
Ali surgiram bluesmen fundamentais como Charlie Patton, Tommy Johnson, Son Houses, Skip James, Big Joe Williams e o lendário Robert Johnson.
Para alguns historiadores, o que fazia o blues do Delta ser único era a forte influência africana, com um ritmo sincopado, marcado pelos pés, o uso do falsete nos vocais, repetições de um mesmo acorde e o uso de um truque que viraria uma marga registrada do gênero, o slide.
Deslizando o gargalo de uma garrafa ou um pedaço de osso – mais tarde, tubos de metais também seriam usados – sobre as cordas do violão, o músico conseguia um efeito inédito no instrumento.
Com o início da Segunda Guerra Mundial, o panorama social começou a mudar nos estados do Sul.
Graças à entrada de negros nos quadros militares, surge uma promessa de integração racial.
Pura ilusão.
Encontrando o mesmo cenário na volta para casa, os negros passaram a se isolar cada vez mais em bairros próprios (os famosos “inner cities”) e nasce uma consciência racial que desembocaria nos movimentos pelos direitos civis nos anos 60.
No mundo da música, o esquecido blues regional cede espaço para um som nitidamente urbano, marcado pela presença de um novo ingrediente: a guitarra elétrica.
A partir de 1940, as companhias gravadoras descobriram que já existia um importante mercado consumidor de blues entre a minoria negra que se instalara nas grandes cidades industriais do Norte.
Além das gravações oficiais, circulavam muitas cópias clandestinas de discos negros.
Surgiu uma verdadeira indústria, a dos “race records” (“discos raciais”), destinada especificamente ao público negro.
Explorando o filão do blues, os discos raciais ganharam um novo impulso após a Segunda Guerra, quando essa forma de música negra ressurgiu com o nome de “Rhythm & Blues” nos guetos das grandes cidades, principalmente no South Side de Chicago.
O R&B nada mais era do que o velho blues rural em roupagem urbana, acompanhados por guitarras elétricas completamente ensandecidas e em ritmo cada vez mais acelerado.
Para muitos, o Rhythm & Blues assinava o atestado de óbito da tradição dos bluesmen do Delta do Mississipi.
O escritor negro LeRoi Jones (que depois adotaria o nome de guerra de Amiri Baraka), via no rhythm & blues “um anátema para a classe média negra, um tipo de frenesi e vulgaridade que nunca tinham estado presentes nas formas mais antigas do blues. De repente, era como se uma grande parte da fachada humanista euro-americana adotada pela música afro-americana tivesse sido lavada ou eliminada pela guerra. Os cantores de rhythm & blues tinham literalmente de berrar para se fazer ouvir acima dos sons de diversos instrumentos eletrificados e das ruidosas seções rítmicas. De certo modo, quanto mais alto o acompanhamento instrumental e mais gritado o canto, mais expressiva parecia a música. O blues sempre fora música vocal – e devemos admitir que o acompanhamento instrumental do rhythm & blues ainda seguia aquela tradição vocal – mas agora a voz humana tinha de lutar, de gritar para ser ouvida.”
O veterano bluesman John Lee Hooker via a questão por outro ângulo: “para os garotos negros comuns, parece que o blues é um constrangimento. Acho que eles gostam de blues, mas sentem um certo embaraço porque seus avós foram criados na escravidão. Eles gostam, mas acham que nos dias modernos não deviam mais ouvir esta música – é como se ela os puxasse para trás no tempo”.
Na verdade, o que aconteceu no pós-guerra foi que os negros da América urbana passaram a nutrir os mesmos sonhos de consumo da classe média branca.
Afinal, isso estava até embutido na idéia da democracia e na luta pelos direitos civis.
Não por acaso, o ano em que estourou o rock’n’roll, 1954, foi o mesmo em que o Supremo Tribunal dos Estados Unidos adotou a decisão histórica de proibir a segregação racial nas escolas públicas.
Em Memphis, agora a capital da região do Delta do Mississipi, garotos como B.B. King, Elmore James, Sonny Boy Williamson e Howlin’ Wolf dão seus primeiros passos.
Lá nasceu a parceria de Muddy Waters e Willie Dixon, que rendeu frutos como os clássicos “Hoochie Coochie Man”, “Mannish Boy” e “Rollin’ And Tumblin’”.
A cidade ainda viu surgir Little Walter, Otis Rush, Magic Sam e Buddy Guy.
Enquanto isso, o solitário John Lee Hooker levanta sua voz em Detroit.
Cada um à sua maneira, todos deixaram sua marca na História do blues.
São os mesmos três acordes, os mesmos doze compassos, mas nas mãos de um mestre o blues é sempre uma história diferente.
Vale a pena conferir algumas dessas histórias.
Elmore James nasceu em 27 de janeiro de 1918, em uma fazenda perto da cidade de Richland, no Delta do Mississipi.
Sua mãe, Leola Brooks, tinha 15 anos de idade.
Embora sendo filho ilegítimo, ele foi criado por sua mãe e por Joe Willie James, que ele pensava ser seu pai e que lhe deu o sobrenome.
Como meeiros, eles movimentavam-se de fazenda em fazenda em busca de ocupação econômica.
E, à semelhança de outros rapazes do Mississippi rural, Elmore aprendeu a tocar violão em um instrumento improvisado feito com o cabo de uma vassoura.
Com 14 anos, ele já era um músico nos finais de semana, mas não se limitou a isso.
Com pouco mais de 18 anos, ele se juntou a músicos que viajavam através do país, como Robert Johnson, Howlin Wolf e Sonny Boy Williamson, peregrinando pelas cidades do Delta do Mississipi até a 2ª Guerra Mundial eclodir.
Elmore James serviu por três anos na Marinha e quando teve alta, ficou por um bom tempo em Memphis, trabalhando como músico de aluguel em clubes noturnos.
Foi nessa época que ele descobriu que tinha um problema cardíaco sério.
Combinado com sua mania de beber e de se entupir de anfetaminas, o problema acabaria por se revelar fatal.
Suas primeiras gravações, para o selo Trumpet (de Jackson, Mississipi) só foram acontecer em 1951.
Ao se transferir para Chicago, pouco depois, Elmore James tornou-se um dos pioneiros na modernização do blues tradicional nascido do Delta do rio Mississipi.
Ele foi o grande responsável por moldar todo um estilo novo de tocar slide guitar (o chamado “bottleneck”) que acabou se transladando do blues para o rock.
O clássico “I Believe I’ll Dust My Broom”, por exemplo, já havia sido gravado há tempos por seu autor, Robert Johnson, mas só foi ganhar seu tratamento definitivo na interpretação de James, que transformou “Dusty My Broom” em hino do blues elétrico, criando um dos mais imitados riffs de slide guitar de que sem notícia.
Atualmente, os músicos utilizam um pequeno tubo oco de metal, que cobre todo o dedo anelar, para alterar o tom em que se toca, deslizando esse tubo pelas cordas da guitarra.
Originalmente, usava-se o gargalo de uma garrafa ou pedaços de ossos.
Elmore James desenvolveu um som distinto tocando guitarra com slide, geralmente com um pedaço de vidro ou metal, e muitas vezes utilizando uma faca de bolso.
Ry Cooder, George Harrison, Johnny Shines, Muddy Waters e Joe Walsh são alguns dos músicos que utilizaram a técnica desenvolvida por ele.
Há também Duane Allman dos “Allman Brothers Band”, grande guitarrista do slide, que costumava usar vidros de medicamentos para a prática.
Mas Elmore James não era apenas um mago da guitarra que reinventou o slide. Era muito mais.
Sua maneira de tocar o blues fez dele um dos mais influentes instrumentistas da guitarra elétrica de todos os tempos, além de possuir uma das maiores vozes do blues, intensa e expressiva.
Poucos cantores de blues tinham uma voz capaz de competir com a dele.
E Elmore James sempre deu tudo o que tinha e tudo o que podia investir emocionalmente em suas músicas.
Ele não chegou a tocar para platéias brancas ou gravar discos com pesos pesados do rock como Eric Clapton e Johnny Winter, mas deixou uma brilhante trilha atrás de si e seu estilo continua a influenciar os guitarristas que colocam um slide no dedo para tocar os lamentos do blues.
Elmore James exerceu uma influência capital nos trabalhos de B. B. King e Chuck Berry, de acordo com reiterados depoimentos dos dois músicos.
O bluesman morreu de ataque cardíaco, em Chicago, aos 45 anos de idade, em maio de 1963.
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