Roberto
Pompeu de Toledo
Apezar
da xuva, muita jente esteve prezente ao ezersisio de jinastica qe
teve lugar no colejio. Omens, mulheres e criansas no fim cantaram o
Ino Nasional. Ouve pesoas qe ate xoraram de emosão cuando a festa
terminou. Oje qem qiser pode asistir a nova aprezentasão.
A
impressão é de escombros do que foi outrora a língua portuguesa em
sua forma escrita. Como se tivesse sido atingida por uma bomba e
alguns destroços irreconhecíveis houvessem sido resgatados da
hecatombe.
A
comparação não é absurda. Tem o efeito de uma bomba a radical
reforma ortográfica defendida pelo site Simplificando
a Ortografia (simplificandoaortografia.com), criado pelo professor de
português Ernani Pimentel.
Sua
proposta é acabar com letras que não se pronunciam, como o “H”
no início de certas palavras e o “U” que se segue ao “Q” em
“quintal” e “querido”, assim como a duplicidade de
representação do mesmo som em “S” e “Z”, “SS” e “Ç”
ou “G” e “J”.
Não
é uma proposta inovadora. Para citar uma das que já se apresentaram
com espírito semelhante no passado, o general Bertoldo Klinger,
figura preeminente da Era Vargas, não só formulou a sua como a
praticou – ele grafava seus textos segundo as regras que inventou.
O
general (aliás, jeneral) Klinger, em quem o reformador da língua
escrita se misturava ao reformador do povo brasileiro, explicava:
“Ortografia é lojica. Lojica é ordem. Sem ordem não a nasão.
Logo, não a nasão sem ortografia lojica”.
O
site do professor Ernani Pimentel podia passar por uma excêntrica
curiosidade, tal qual a reforma de Klinger, não fossem duas
circunstâncias.
Primeira:
a de Pimentel ter sido nomeado um dos dois coordenadores (o outro é
o professor Pasquale Cipro Neto) do Grupo Técnico criado na Comissão
de Educação do Senado para discutir o Acordo Ortográfico entre os
países de língua portuguesa.
Segunda:
a de vivermos tempos propícios aos populismos/paternalismos. A
“simplificação” da ortografia tem sido enfeitada com o charme
mais do que discutível de facilitador da alfabetização e fator de
“inclusão social”.
Essa
história tem origem nas discórdias que se seguiram à assinatura,
em 1990, do Acordo Ortográfico pelo qual os países de língua
portuguesa se comprometeram a unificar suas regras ortográficas.
Restrições
surgiram em todos os países signatários. No Brasil o acordo deveria
entrar em vigor em 2009, e na prática realmente entrou, com sua
adoção nas escolas, na imprensa e nas editoras de livros.
Oficialmente,
no entanto, dadas as divergências com os outros países, a
presidente Dilma Rousseff adiou a entrada em vigor para 2016.
Nesse
vácuo entrou a Comissão de Educação do Senado.
Decidiu
rediscutir o acordo e criou um grupo de trabalho que tanto pode
acabar por confirmá-lo ou rejeitá-lo quanto – o que é pior –
propor uma reforma de sua própria iniciativa.
Segundo
o presidente da comissão, senador Cyro Miranda (PSDB-GO), o acordo
teria sido feito “sem ouvir ninguém”.
A
comissão resolveu então “botar ordem na casa”, convocando o
debate.
Daí
ao encanto com a proposta do professor Ernani Pimentel foi um passo.
“Estou
totalmente de acordo com o professor Ernani”, declara o senador
Cristovam Buarque, membro da Comissão de Educação, segundo se lê
no site do professor.
Duas
audiências públicas serão realizadas pelo Grupo de Trabalho da
Comissão de Educação na primeira quinzena de outubro.
Espera-se
que, nelas, falem mais alto as palavras da professora Marília
Ferreira, presidente da Associação Brasileira de Linguística, em
carta ao senador Cristovam Buarque: “A ortografia não existe para
representar a fala, mas é uma representação abstrata e
convencional da língua. Para poder ser de fato funcional, a
ortografia deve necessariamente afastar-se da diversidade da fala. Só
assim se poderá garantir um sistema ortográfico estável e perene
em que haja uma única representação gráfica para cada palavra. É
essa representação única que torna possível que a palavra seja
reconhecida em qualquer texto, independentemente de suas inúmeras
pronúncias no espaço e no tempo”.
A
alternativa é a xacina do testo em língua portugueza. A anarqia. A
ecatombe.
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