Xico
Sá
A
moça na fila do raio-x do aeroporto dos Guararapes no seu crochê
moderno, o crochezinho da nova era, digitando sem parar -já reparou
como os dedinhos lembram o gestual do ponto das antigas agulhas
maternas?, só que nossas mães faziam sentadinhas no sofá e não
trombavam no poste da esquina.
Mas
sem essa de comparações nostálgicas. O que vale é que a cada
mensagem, a moça faz uma cara de safadeza mais linda desse mundo.
Multiplicadas feições do desejo de quem voaria para os braços do
seu novo rapaz.
(É
deveras deselegante quando em uma turma -na mesa de bar ou
restaurante-, alguém ou toda gente junta se joga no crochezinho e
esquece a humanidade. Quanta deselegância e fraqueza d´alma).
Uma
moça que caminha, desacompanhada, para pegar um avião rumo à
felicidade, não. Não mesmo. Nada mais justo que esquentar o
encontro com promessinhas calientes. Vale.
Tente
vê pelos olhos do cronista. Ela ri com maldade, ela respira fundo,
ela aperta o celular brevemente sobre os peitos. Para completar, a
moça usa calças vermelhas, como a espiã sexy Brigitte Montfort
(acima) desenhada pelo Benício para os livrinhos de bolso da série
ZZ7, pulp fiction imperdível.
Opa,
o raio-x apita a luz em vermelho, mas não há sinal de proibido para
o desejo que já corre mundo. Ela dá meia volta como se nada tivesse
ocorrido.
Tira
o casaco, no que se revelam tatuagens incríveis nos braços, uns
braços, ave!, como naquele conto machadiano que li ainda na escola.
Tira
o sapato… que pezinho! Tira colar, pulseiras, cinto… O belo
strip-tease aeroportuário.
Apita
mais ainda no raio-x. Meia-volta. O sorriso está mais safado ainda,
meio Monalisa meio bocão-Jolie.
Uma
mulher em fogo, com um São João de Arcoverde por dentro, sempre
apitará no raio-x.
Da
mesma forma que os machos com as monumentais ressacas também apitam.
Trato daquela ressaca que mais parece uma dengue existencialista, as
ressacas dos homens na madureza.
O
certo é que depois de muitas tentativas, a moça seguiu no seu
inabalável crochezinho tecnológico para o avião. A cada mensagem,
um gesto; encolhia a hipótese de barriguinha –toda mulher tem que
ter no mínimo uma hipótese de barriguinha, como Vinícius dizia.
Na
sua poltrona 7D, imprensada entre dois homenzarrões, fez o
crochezinho do amor e da safadeza até a aeromoça nervosa proibi-la.
Fechou os olhos, apertou as mãos grudadas entre as pernas e dormiu
entre as nuvens de algodão agridoce –como o tempero dos seus
pratos prediletos.
Logo
mais estaremos no Galeão…
Esteira,
mala etc, e a moça no crochezim irrefreável… Só levantou a
cabeça ao cruzar a porta de saída e avistar o seu novo rapaz, um
barbudinho moderno e quase hipster, segurando desajeitadamente um
maço de flores entre as pernas. Só assim conseguia digitar seu
ponto cruz do tesão inadiável.
O
beijo também foi desajeitado, coisas dos primeiros encontros… Os
celulares se espatifaram em um chão de estrelas, as flores
lindamente amassadas entre os dois… Agora, torço, menos
crochezinho e mais questão de pele, como falavam os sábios e velhos
hippies.
Afinal
de contas, sempre vale repetir aqui o mantra greco-carioca do poeta
Eduardo Cac: para curar um amor platônico, só uma trepada homérica.
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