Ricardo
Coiro
Quantas
vezes você já ouviu alguém falar – ou escrever – algo sobre as
dores que o machismo causa nas mulheres? Muitas, certo?
Eu
também já ouvi – e li – inúmeras argumentações sobre as
facadas (não apenas as que furam a pele, mas também aquelas que
rasgam a alma) que a cultura machista desfere nas moças.
Porém,
infelizmente, pouco ouvi sobre os incontáveis males que o machismo
gera aos machos.
Você
já ouviu? Já leu algo sobre? Já refletiu a respeito? Não? Então
acho que chegou a hora de escrever algo relacionado ao impacto
negativo – e às vezes imperceptível – que o machismo tem na
vida dos homens em contato com a cultura que hoje predomina em nossa
sociedade, ou seja, quase todos.
E
se você, irmão, está achando que eu precisarei forçar a barra e
inventar exemplos irreais para provar que os homens, além de
parcialmente responsáveis pela propagação e perpetuação do
machismo, também sofrem com os efeitos danosos de tal cultura – ou
doença –, prepare-se! Porque nas próximas linhas eu provarei que
o machismo é o culpado (direto ou indireto) por muitas das dores que
você sente, e que, até hoje, ninguém soube informar por qual
motivo ocorrem.
Antes
mesmo de tirar a cueca e colocar o pau para fora, meu caro, uma voz –
geralmente em tom imperativo – começa a lhe dizer coisas como:
“Você precisará ficar duro como uma rocha!”, “Você – para
que ela não duvide do seu potencial – terá que dar duas sem
tirar!”, “Se ela não gozar você será considerado um inútil!”.
Estou certo?
E
sabe como eu sei das coisas que acontecem em sua mente, mesmo em um
momento tão íntimo? Sei, pois já ouvi – e às vezes ainda ouço
– as mesmas vozes que você! E não apenas as ouço, irmão, eu
também me sinto pressionado por elas.
E
por que ouvimos essas vozes malditas? Ouvimos porque sofremos grande
influência de uma cultura na qual os galãs dos filmes nunca broxam,
os tios discursam como se nunca tivessem deixado uma mulher
insatisfeita e os filmes pornôs nos fazem acreditar que o macho de
verdade deve transformar o sexo em um esporte de resistência. Não é
mesmo?
Ouvimos
essas ordens interiores porque estamos imersos em uma cultura que não
dá ao homem o direito de não querer transar, por exemplo. E mesmo
que, às vezes, você queira trocar o sexo por um bom DVD, você se
sentirá impelido a comparecer, endurecer e fazê-la gozar, e
endurecer de novo, like a sex machine. Pois homem que é homem está
sempre pronto pra guerra, ou melhor, pra foda.
Não
é isso que dizem por aí? Porém, nem sempre é isso que o nosso
corpo quer. Mas o machismo está nem aí para o que o nosso corpo
quer ou deixa de querer, pois homem que é homem, irmão, trepa até
quando não quer, só para provar que é homem. Quanta besteira, né?
Sexo
não é obrigação, e, muito menos, é algo que devemos fazer para
provar a nossa potência ou virilidade. Entretanto, é exatamente
isso que o machismo nos faz achar. E é aí que começa um grande
problema: logo percebemos que somos biologicamente incapazes de
igualar as performances (dignas de bicho no cio ou máquina 4x4) que
o machismo vive a dizer que PRECISAM ser realizadas por qualquer
homem que deseja ser visto como homem.
E,
obviamente, nos sentimos frustrados ou menores. E pior: nos sentimos
inferiores a maioria dos homens que, com medo de serem considerados
menos homens, vivem a dizer (mentir) que dão três sem tirar, que
nunca deixaram uma mulher insatisfeita e que não chegaram nem perto
de broxar.
A
cultura machista glorificou – e continua a glorificar – a figura
de um homem que, em vários aspectos, não é aquele que somos,
desejamos ou podemos ser, mesmo se quisermos.
E
hoje, em pleno século XXI, até no instante que precede a morte, nos
forçamos a reter as lágrimas e os sentimentos, e a agir com a
frieza dos mocinhos do faroeste. Porque chorar, de acordo com o
machismo, não é coisa de homem.
E
assim, muitas vezes, em uma tentativa idiota de não mostrar aquilo
que sentimos, nós, homens, implodimos. Ou bebemos para anestesiar a
dor, porque é isso (beber até cair) que homem faz; não é? Mesmo
que faça mal.
Nós,
machos (como insistem em dizer que devemos ser), desde a escolinha,
nos sentimos obrigados a esconder a dor de um joelho ralado e a calar
as palavras que vêm do nosso coração.
“Isso
é coisa de menininha!”, costumamos pensar, antes de respirar fundo
e de engolir, a seco, o que sentimos vontade de expressar.
“Isso
é coisa de macho!”, é o que se passa na cabeça do moleque que,
mesmo com medo das consequências da briga, parte para a porrada - só
para provar ao mundo que nada tem de covarde.
O
mesmo machismo que não dá espaço às mulheres, meu caro, faz com
que os homens se sintam obrigados a ocupar um espaço que, muitas
vezes, não está nos planos nem nas vontades deles.
O
mesmo machismo que diz que a mulher, mesmo se quiser, não tem
direito de transar com vários homens, também faz com que muitos
homens, mesmo quando não querem, aceitem uma transa, com medo de
serem vistos como os fracassados que negam fogo.
O
mesmo machismo que coloca a mulher em posições profissionais
inferiores, irmão, também faz com que muitos homens se sintam mal
por ganharem menos do que as esposas. Percebem o quanto o machismo
também faz mal – e muito – aos machos?
Por
isso, irmão, se você é do tipo egoísta – e idiota – que só
muda quando algo afeta diretamente – e de maneira negativa – a
SUA vida, agora você já tem um ótimo motivo para repensar nas suas
atitudes e, finalmente, começar a ajudar na construção de um mundo
no qual, independente das diferenças de gênero, todos poderão
fazer, sem olhares feios e punições veladas, somente aquilo que
querem.
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