Por Marcos de Vasconcellos
Essa história me foi contada pelo senador Ruy Palmeira
(PFL-AL). Havia no interior de Pernambuco um conhecido boticário que juntava às
funções de aviador de receitas, as de médico, cirurgião, conselheiro técnico e
matrimonial. Tal prática é costumeira no Nordeste sobretudo nos municípios mais
carentes, ou seja, todos.
Chegou na farmácia, carregado numa padiola improvisada, um
cidadão que tinha levado uma carga de chumbo nos peitos e carga das mais
competentes: cartucho 12, caroço 3.
O peito do infeliz era uma pasta de carne, sangue, pano e
chumbo, beirando o desengano, mas o factótum mandou que o levassem para os
fundos da botica. Lá, esvaziou um cartucho do mesmo calibre que esbagaçou o
injuriado e laboriosamente o foi reenchendo com os grãos retirados da ferida.
Horas depois, o cartucho cheio até a boca, deu por finda a catação.
O ferido gemeu cinco dias, afogueou-se em febre e delírio
mais oito, deu por tenência de si no nono, convalesceu, sarou. A cicatriz
restante não fazia jus ao estrago, tão bom foi o trabalho de restauração do
boticário. O homem foi-se embora como novo para voltar uma semana depois com
queixa:
– Ainda tem chumbo no ferimento, dotô...
– Não tem.
– Tem.
O doutor apalpou o peito do ressuscitado por desencargo de
consciência. De fato, não tinha chumbo nenhum, mas o homem queria um remedinho.
O dono da casa encheu um vidro médio com água destilada, coloriu com um pouco
de azul-de-metileno, macerou erva-de-santa-maria e misturou mode ficar com
gosto ruim, mode dar fé na cura. Recomendou: uma colher de manhã e uma de
tarde, quando o sol se for. Até acabar o vidro. Nome do “remédio” escrito à mão
na etiqueta: Chumbol.
Três meses depois, o doutor não tinha mãos a medir, tantas
as encomendas do milagroso Chumbol. Em terra de muito tiroteio, a poção mágica
fez extraordinária sucesso e logo foram acrescentados parentes na família:
Facol, Porretol, Peixerol.
Mais tarde, contou Ruy Palmeira, o boticário, já riquíssimo,
vendeu tudo e mudou-se para o Recife.
É como diz o Mauritônio Meira: o mundo se acaba e o Nordeste
não se rende.
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