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segunda-feira, julho 01, 2013

A volta dos cangaceiros mortos-vivos


Edson Aran

Era uma manhã cinzenta e depressiva feito um disco da Maria Bethânia. Eu abri os olhos, mas não quis me levantar. Fiquei deitado e vi que horas eram. Depois peguei o meu iPad 5.0 com Tração nas Quatro Rodas para ler as notícias do dia.

O mundo sempre foi uma pouca-vergonha, mas isso já era ridículo: “Em busca de um novo amor, ex-BBB Greyci Quéli depreda restaurante no Leblon. PM usa bomba de efeito moral, mas é abatida por 487 BBBs de edição anteriores, que depois seguiram para a casa de Boninho, onde ficarão acampados até conseguir papel em ‘Malhação’”.

Tem alguma coisa muito errada com essa merda de país ou meu nome não é Ermenegildo Pinto, pensei. Eu entendo desse troço. Mobilização espontânea das massas só acontece quando passa trio elétrico na rua. Povo só se junta pra fazer coreografia de axé music. Sair marchando com cartolina e molotov? Nem a pau, juvenal! Isso é conspiração. E das boas.

Abro a janela. Lá em baixo, uma marcha que defende Aborto Gay Mutuamente Consentido entra em choque com a passeata dos Evangélicos Pró-Cura Gay Depois da Meia-Noite. A polícia tenta conter os baderneiros com spray de pimenta dedo-de-moça temperada com semente de mostarda, receita de um chef de cozinha contratado especialmente para controlar os protestos.

Do outro lado da rua, duzentos caras usando máscaras do Guy Fawkes exigem:

1) A volta do AI-5 e do Chapolin Colorado

2) Show do Michel Teló em Santa Ignorância do Norte (MT)

3) A Revogação Imediata da Lei do Ventre Livre


Tomo um café preto feito o futuro da América Latina. Na TV, uma mulher gorda e cheia de laquê propõe plebiscito para fazer uma comissão para discutir como elaborar uma constituinte e agendar uma reforma política.

Isso, definitivamente, não estava certo. Não eram apenas R$ 0,20. Nem malabarista de farol aceita essa merda. Da última vez, o cara arrebentou o vidro do meu carro com três bolas de tênis.

Isso era outra coisa. Forças ocultas solertes, salafrárias, safadas e sem-vergonha estavam usando memes para manter a massa na rua.

Um meme é igual a um gene: é compacto, mas contém informação para criar um organismo inteiro. Um meme funciona como um vírus: depois de inoculado, se propaga sozinho, afetando corações e mentes destruídas por sertanejo universitário e piadas do Rafinha Bastos.

Isso era uma conspiração. Naquela manhã, eu tomei uma decisão: eu desvendaria a trama fedaputa ou morreria tentando.

Peguei o celular e liguei pro Raulzito. Raulzito é um cara que se veste como Raul Seixas e fala feito o Mano Bronha.

“Raulzito? Ermenegildo, mano. Firmeza?”

“Aí, véi, tô na quebrada quebrando tudo com os manos sangue bom. Tá o maior perreio. Ficou pequeno pra esse país vacilão!”

“Cala a boca, retardado!”, eu disse, polidamente. “Você é massa de manobra de uma conspiração internacional, ô cretino.”

“Aí, bródi, não vem moscando não que o tambor vai girar pra ti, tá ligado?”

Não dei trela pro maluco.

“Sai dessa merda agora e vem pra cá que nós temos uma missão: acabar com essa conspiração ou tomar o poder! O que for mais fácil. E no caminho vê se acha o malaco do Bom Selvagem”.

Bom Selvagem é um índio que anda com a gente. Ele é malandro e manipulador feito um marqueteiro, manja? É um silvícola que nasceu mau e depois foi corrompido pela sociedade.

Juntos – eu, Raulzito e Bom Selvagem – representamos as três raças que formam o Brasil: canalha, maluco e safado. E juntos nós vamos acabar com essa conspiração lesa-pátria ou eu não me chamo Venceslau Pietro Pietra! Opa, espera... Esse é o nome que eu uso pra falsificar cartão de crédito. Desculpa aí, foi mal.

(CONTINUA)

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