Na semana passada, fui excluído do Facebook por postar essa
resenha antiga (de 2008), feita no site Centro Cultural DoSol, sobre o disco “The
Charque Side Of The Moon”, de uma galera amiga de Belém do Pará. Aparentemente, alguma alma
sebosa não gostou da capa do disco, denunciou o fato aos capangas do Mark
Undeberg e eles me expulsaram do cabaré. Foda-se. Estou reproduzindo a resenha
aqui no meu mocó:
Em tempos de tecnologia e misturas, já está se tornando até
comum um artista pegar um álbum clássico e reinventá-lo. Foi assim com
Dangermouse e seu “Grey Album” um mash-up do “Álbum Branco” dos Beatles com o
“Black Album” do rapper Jay-Z. Depois veio o DJ BC juntando Beatles e Beastie
Boys. A tendência de misturar sons as vezes opostos, recriar em cima de obras
já prontas, ganhou espaço e cada hora surge uma novidade.
No Brasil os mash-ups já fazem sucesso em determinados
meios, mas agora um grupo de músicos paraenses resolveu ir além e recriou um
clássico do Pink Floyd em uma versão bem particular. A idéia surgiu da cabeça
de Luiz Félix, guitarrista, percussionista e vocalista da banda La Pupuña, do
Pará, que logo convidou o baixista da banda, Fabrício Jomar, para regravar o
álbum “Dark Side of the Moon” com pegada paraense, a base de guitarrada,
cumbia, lundum, brega e surf music.
O resultado é impressionante. Estão lá todos os sons, os
detalhes e a sequência das músicas do original, todo o clima, todas as
invencionices, toda a viagem do clássico álbum de 1973, numa fidelidade até
assustadora. Tudo certinho, como quase se fosse o original, mas é tudo com um
tempero especial.
O disco foi gravado com a banda La Pupuña e um time de
convidados que alteraram o DNA do disco e injetaram música e elementos
paraenses no universo progressivo. Logo no início os sons do carimbó e dos
barcos popopô fazem a introdução de “Speak to me Breath” para logo entrar ao
mesmo tempo um irresístivel suingado e o espirito do Pink Floyd da década de
70. “On the Run” traz a competência de Pio Lobato e Guilherme Guerreiro do
Cravo Carbono.
Os sinos e o despertador de “Time” permanecem mas na verdade
eles estão substituídos pelos sinos da Basílica de Nazaré e pelo despertador de
Luiz Félix. Cantada por Roosevelt Bala, vocalista do Stress, banda pioneira no
heavy metal brasileiro, com reforço da cantora de brega Denise Lima, a mais
conhecida música do disco segue bem fiel até aos poucos se transformar num
carimbó pelas mãos percussivas do grupo regional Os Baioaras. Sacrilégio? Pelo
contrário, uma homenagem marcante e especial que trafega por todas as faixas do
disco.
Quem imaginaria Gabi Amarantos, cantora de Tecnoshow,
soltando a voz em uma vesão de “The Great Gig in the Sky”? Mais ainda, a
reconstrução de outra clássica como “Money”, que começa alterada com uma base
de percussão suingada, segue com as vozes da própria Denise Lima e da vocalista
da banda Madame Saatan, Sammliz, e termina desconfigurada genialmente com solos
de guitarrada de Mestre Vieira e um transe percussivo paraense.
A viagem segue durante “Us and Them”, “Any Colour You Like”,
que ganha uma percussão merengue, “Brain Damage”, com direito a risadas
sampleadas de Fafá de Belém, e a incrível versão quase lambada de “Eclipse”. É
como se o Pink Floyd tivesse gravado o mesmo disco de 35 anos atrás, mas que no
sangue de Roger Waters e David Gilmour, além de rock progressivo, psicodelia,
texturas sonoras, jazz fusion e art rock, corresse uma sonoridade latina.
Um quem é quem da música paraense atual, com convidados de
estilos diversos abrilhantando um trabalho de alto nível que já chamou atenção
de gravadoras estrangeiras que devem lançar o álbum na Europa. O “Charque” do
título se refere mesmo a carne-do-sol, mas também a como é chamada a genitália
feminina lá no Pará (daí a capa do disco). Um trabalho para ouvir e reouvir,
pegar o original e ficar comparando, notando as diferenças e curtindo a criatividade
dos músicos paraenses. Um dos lançamentos mais interessantes do ano desde já.
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