Por Rita Abundancia
Os especialistas em robótica e inteligência artificial
preveem que em 2050 os robôs sexuais já estarão disponíveis para invadir as
nossas camas e, certamente, nos proporcionar orgasmos com duração e intensidade
programadas.
É provável, também, que, no futuro, muitas pessoas optem por
ter esse humanoides como parceiros e até mesmo decidam se casar com eles. Pode
ocorrer, inclusive, de a legislação, que sempre vem a reboque das demandas
sociais, comece aos poucos, nos diferentes países, a se abrir no sentido de
autorizar esse tipo de união, o que será comemorado – tal como agora
comemoramos a admissão do casamento entre pessoas do mesmo sexo –, depois de
amplas campanhas de conscientização com slogans como “os androides também têm
sentimento” ou “o amor não é apenas uma questão de pele”.
Atualmente, enquanto esse futuro – visto por alguns como
alvissareiro e por outros como dantesco – não chega, muitas pessoas se
satisfazem com as bonecas, manequins sexuais bem menos sofisticados do que os
androides do futuro mas que vêm sendo cada vez mais aperfeiçoados. Seres de
aparência quase real, com cílios e cabelos naturais, capazes de serem
articulados para se acomodar à prática de uma considerável parcela das posições
contidas no Kamasutra. Mulheres e homens que não envelhecem, com uma pele de
tato muito similar ao da pele humana e com órgãos sexuais e corpos capazes de
armazenar calor, para que a ausência de “calor humano” não se torne um problema
na experiência e no desfrute desses sofisticados brinquedos sexuais. Produtos
de luxo cujos preços oscilam entre 5.000 euros (25.000 reais), para os modelos
mais simples, a 25.000 euros (105.000 reais).
Até mesmo as pessoas de mente mais aberta franziriam a testa
diante da ideia de comprar uma boneca sexual, enquanto a grande maioria tende a
ver os fãs desses objetos como seres pervertidos. No entanto, como diz Matt
Krivicke, um escultor que abandonou o seu ofício de criador de máscaras de
Halloween e agora integra a equipe da Sinthetics – empresa sediada em Los
Angeles e que fabrica as bonecas sexuais mais perfeitas e realistas do mercado –,
“as pessoas não fazem muitas objeções a um vibrador pelo fato de lhe ter sido
amputado o corpo inteiro. Não tem rosto, não tem braços nem pernas, não precisa
fazer abdominais, não tem barriguinha de chope. É apenas um pênis, e isso é a
última coisa para a qual inventaríamos alguma desculpa”. As declarações de
Krivicke, extraídas de uma entrevista publicada pelo The Independent, não são isentas
de um certo senso comum.
O fato é que o mercado de bonecas sexuais hiper-realistas
está em plena expansão, e já existem fóruns e comunidades sobre o tema na
Internet, como o Thedollforum.com ou ourdollcommunity.com, em que pessoas que
compraram uma delas postam fotografias e trocam experiências. Como no caso dos
casais reais, depois de algum tempo o sexo começa a deixar de ser tão
frequente, chegando até mesmo a deixar de existir. Mas as bonecas continuam a
exigir cuidados. É preciso penteá-las, vesti-las, trocá-las de posição e
escolher os acessórios que mais combinem com sua personalidade.
Em sua entrevista, Krivicke conta que a Sinthetics não
produz à moda chinesa, muito ao contrário. Seus manequins – como eles preferem
chamá-los – são produzidos apenas sob encomenda e de acordo com as preferências
do consumidor, de forma que cada boneca tem a sua própria aparência e
personalidade. O cliente, como sinaliza o site da empresa, pode escolher quase
tudo: altura, compleição, cor do cabelo e da pele, tamanho dos seios, da vagina
ou do pênis, cor dos olhos. As variáveis são infinitas e superam de longe as
opções dos cardápios de restaurantes que fazem pizzas por encomenda.
Pode-se também encomendar uma boneca do ex-parceiro, ou
parecida com ele, mas, para começar a construir esse avatar, a empresa exige a
autorização da pessoa a ser reproduzida. Há quem sonhe, também, com manequins
que sejam uma reprodução de alguma celebridade. Nesse caso, a empresa procura
chegar a um ponto de equilíbrio entre a satisfação do cliente e a produção de
um clone de Beyoncé, Kate Moss ou Brad Pitt, mudando algumas características
para que a semelhança seja ao menos razoável.
Nem todos, porém, almejam a perfeição. O escultor lembra o
caso de um cliente idoso que encomendou uma boneca com rugas e pés-de-galinha,
para que se aproximasse mais e tivesse mais coisas em comum com ele. A empresa
é flexível e se adapta às preferências dos consumidores, com exceção de um
caso: os pedidos de manequins infantis. “Não aceitamos esse tipo de encomenda,
tivemos, já, alguns incidentes com isso e ao final fomos obrigados a alertar as
autoridades”, admite Krivicke na entrevista.
Mas qual é o perfil do homem ou da mulher que decide comprar
uma boneca sexual e que dispõe para isso de 5.900 dólares (cerca de 23.000
reais), quantia mínima a ser desembolsada para obter a versão mais simples de
uma dessas deusas de silicone? Segundo admite Krivicke, “a grande maioria dos
nossos compradores são pessoas fascinadas pelo corpo humano e tão ‘saudáveis’
quanto qualquer pessoa com que você cruza nas ruas”. Os motivos que levam
alguém a adquirir esses produtos e a realizar suas fantasias com eles não são
de ordem apenas sexual.
Alguns procuram “uma boneca que lhes ajude emocionalmente
depois da perda de um ente querido, já que, durante o luto, não se sentem em
condições de assumir uma nova relação. As bonecas servem, então, como uma
‘ponte’ até que a autoconfiança retorne (...) Alguns casais veem nos manequins
uma maneira segura de introduzir um terceiro no relacionamento, pois não existe
nenhum sentimento envolvido. É uma outra forma de exploração sexual, mas sem
traições. As bonecas podem também fazer o papel de substitutos sexuais quando
um dos membros do casal não pode desfrutar do sexo, geralmente por problemas de
saúde, mas não se pretende ter outra pessoa”.
A Sinthetics se volta também para outros grupos de pessoas,
com diferentes orientações sexuais, especialmente os transexuais, oferecendo
manequins trans ou hermafroditas. Só há uma coisa que essas máquinas sexuais de
aparência angelical não deveriam fazer com muita frequência, sob pena de
antecipar consideravelmente a sua data de validade. Já adivinhou o que é? Nada
mais nada menos do que o sexo oral. Como esse “pequeno inconveniente” pode
minar em algumas pessoas o impulso de brincar com esses objetos, a empresa já
encontrou uma solução, e dá explicações sobre isso em seu site.
A criatividade da Sinthetics e seu ímpeto de cobrir um amplo
espectro de fantasias sexuais a levaram a inventar o Vajankle, uma vagina
encravada em um tornozelo, para os fetichistas dos pés ou para quem, não
podendo arcar com os custos de um corpo completo, contente-se com o básico.
O mundo das bonecas sexuais conta com um mercado saudável, o
que leva seus criadores a pensar e a conceber protótipos cada vez mais
realistas. Matt McMullen é um desses cérebros. Ele trabalha para a Abyss
Creations, uma empresa sediada em San Diego, e foi o criador da RealDoll. A
edição norte-americana da revista Vanity Fair dedicou uma longa reportagem ao
processo de criação de uma de suas ‘obras’.
Seu novo projeto leva o nome de Realbotix e consiste em dar
vida e movimento às bonecas, fazendo com que falem, respondam a perguntas e se
expressem com gestos faciais. Para isso, ele conta com uma equipe que inclui
engenheiros que trabalharam na Hanson Robotics. Mc Mullen está convencido de
que seus produtos são perfeitos para as pessoas que “decidiram conscientemente
que não querem ter um relacionamento” de casal, mas que querem fazer sexo frequentemente.
Imaginar um mundo em que os vibradores avançaram dos
genitais para o corpo inteiro, reproduzindo seres humanos perfeitos para o
sexo, já começa a não ser algo que pertence ao gênero da ficção científica.
Segundo a psicóloga e sexóloga Ana Sierra, que trabalha na Fundação Sauce, em
Madri, “existe uma parafilia denominada androidismo, em que as pessoas só se
excitam com androides, bonecos ou robôs. Antigamente, a masturbação e o sexo
oral eram vistos como parafilias. Eu nunca receitei o uso de uma boneca
inflável, mas isso me parece razoável se servir para cultivar o erotismo e
experimentar coisas novas. O problema, como sempre, é quando essa prática se
torna obsessiva e exclusiva. Ou seja, quando não dá espaço para outras práticas
ou, no caso, se transforma em substituto das relações humanas. Precisamos do
contato físico, trabalhar as habilidades sociais, compartilhar, e não me refiro
apenas ao aspecto físico, mas também ao aspecto da energia, desse prazer
psicológico gerado pelo sexo ou pelo fato de se sentir desejado por alguém”.
Hoje, quem pretende se iniciar na brincadeira com bonecos
pode se contentar com uma opção de custo baixo, que, neste caso, responde pelo
nome de Snugamate e consiste em um homem mole e recheado de flanela, que faz as
vezes, também, de almofada. Se suas utilidades são bastante limitadas, são
inúmeras, porém, as suas vantagens: não foge na hora de lavar a louça, não
deixa o tubo da pasta de dente aberto, não urina fora da bacia... Enfim, uma
preciosidade!
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