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domingo, junho 23, 2013

Saíram do Facebook? Agora voltem, por favor.


Edson Castro

“Esses dias tão muito malucos, né?” me disse uma menina no elevador. Tão. No começo parecia que eu estava sonhando. Sai para viajar de férias pelo país, quando voltei para São Paulo uma onda de protestos tomou a rua por uma causa justa (e que me afeta muito).

Eu tenho carro desde 2009. Em 2011, aposentei ele para os dias de semana e venho trabalhar de transporte público por questão de princípios.

Gasto menos, ocupo menos espaço e fujo do trânsito da Radial. Pago meu bilhete único com meu salário e uma diferença de R$ 0,20 por viagem afetam, sim, o meu orçamento no final do mês.

Depois da repressão pela polícia militar, um número maior ainda de pessoas aderiu à onda de protestos. Que animal! E aí, a coisa se perdeu. Eu estou feliz, mas tô muito puto. Por uma série de motivos. São eles:

Flashmobilização


Antes quem convocava os protestos contra o aumento das tarifas era a galera do MPL. Nos últimos dias, tenho visto o surgimento dos mais diversos tipos de eventos no Facebook, alguns criados por movimentos, outros por uma galera nada a ver. Fala-se até de uma greve geral no dia 1º de julho.

Aí chega o dia do evento, aparece tudo de ruim na rua: gente tirando foto com o cartaz de saímos do Facebook para, olha só, postar no Facebook; cartaz com hashtag (alguém avisa que, apesar de estarem funcionando no Face, elas não funcionam na vida real); galerias de gatos e gatas do protesto (quando tem manifesto de gente negra e pobre, ninguém faz spotted disso né?) e o que me irrita mais: Look do dia do manifesto.

Não, vocês não saíram do Facebook, vocês só trouxeram as piores coisas dele para a rua. A falta de um objetivo no protesto atraiu ambulantes vendendo máscaras do V de Vingança, bandeiras do Brasil e camisetas com mensagens. Só faltou um ambulante ligeiro pra vender coquetel molotov e máscara de gás para galera.

Aí fica um bando de bobo indo de lá pra cá, cantando nada com nada, enquanto tomam uma breja. Não estranharia nada alguma agência de publicidade pensar em alguma ação pro protesto. Aposto que a galera ia adorar uma chuva de Twix.

Coisas que ninguém lembra



Nas duas semanas das maiores ondas de protestos do Brasil, rolou isso daqui:

BNDES librou R$ 400 milhões para o Corinthians terminar o Itaquerão

Governardor Geraldo Alckmin sanciona reajuste de seu salário e de secretários

“Cura gay” é aprovada pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara

Senado aprova ato médico

Tirando alguns gritos isolados contra a PEC 37, percebi nos últimos protestos uma série de gritos e cartazes contra as coisas mais genéricas do mundo: Chega de Corrupção, Fora Dilma, Fora Haddad, Abaixo os impostos, Abaixo ao Kinder Ovo Caro, Darth Vader não me representa.

No que isso vai mudar o país? O gigante esperou todos esses anos para ficar fazendo essa merda?

Que tal achar propostas claras, sólidas e que sejam articuladas? Ficar sonhando com um derrubar todos que estão no poder para eleger o Joaquim Barbosa presidente da república soa mais irreal do que a galera que gostaria de transformar o país em uma nova Cuba.

Essa falta de foco e proposta durante a história do mundo gerou a ascensão do pior tipo de merda, como partidos de extrema direita, como o Nazismo, a Ditadura Militar e até mesmo resultou na eleição do Collor nos anos 90, que foi eleito para caçar os marajás. Quanto tempo até um político filho da puta criar como plataforma que ele vai caçar os corruptos e usar toda essa onda como massa de manobra política?

Tô tão puto que eu tô aqui


Conseguimos reduzir os R$ 0,20 e agora? Que tal pararmos um segundinho só para refletir sobre essa vitória e começarmos a formular qual a nova causa que vai nos levar para rua? Não. “Vou fazer um cartaz escrito ‘Tô tão puto que eu fiz esse cartaz’ e vou ficar indo e voltando na Avenida Paulista porque isso vai mudar o mundo”.

Não, filho da puta, não vai. Povo mudo, não muda, mas sem causa, não há mudança. Se eu fosse um dos políticos vendo essa galera indo e voltando na gigante Alameda que a maior avenida de São Paulo virou eu estaria rindo a toa. Invés de se conscientizar politicamente, uma parte da galera que tá na rua prefere focar a energia em bater em militante do PT, PSTU, PSOL e gritar a plenos pulmões “O povo unido não precisa de partido!”.

Não quero virar cenário no fundo do horário político, nem massa de manobra nas próximas eleições, mas, meu amigo, quem não gosta de partido é neonazista e fascista. Não sei aonde você esteve nos últimos anos durante a festa da democracia, mas toda vez que você vota no Deputado da Rota ou no Maluf para limparem a cidade, você está trazendo todos os amiguinhos deles para o poder também.

O povo tá nas ruas


Três coisas. Eu estudei na PUC, trabalho na esquina da Paulista com a Consolação e sou filho de uma professora de escola pública. Na PUC, pelo menos uma vez por mês a galera do C.A. organizava a galera para aderir alguma passeata ou protesto na cidade em prol de alguma minoria. Toda semana tem um protesto novo aqui na Avenida Paulista. Recentemente, houve uma greve de professores da prefeitura e do estado em busca de melhores salários.

Isso é o pouco que eu sei sobre como povo tá aí na rua há muito tempo, desde que a gente pode voltar pra rua depois da Ditadura (e, mesmo durante ela, muita gente arriscou o pescoço para tentar reformar o país). Feministas, negros, gays, lésbicas, sem-teto tão aí lutando pelos seus direitos muito antes de você ter largado a porra do seu Toddy gelado e resolvido vir pra rua reclamar que tá caro comprar um iPhone.

O gigante que acordou em São Paulo trouxe com ela uma parte da classe média reacionária e conservadora. Uma galera que é a favor da redução da maioridade penal, machista, homofóbica, contra o aborto e tem nojo a pobre.

O meu bloco não desfila no seu carnaval


Eu estou feliz com o povo saindo para as ruas. Estou feliz com a galera que grita por lutas justas como tirar o Feliciano da Comissão de Direitos Humanos, Abaixo a PEC 37 entre outros, e conseguiu a adesão de muita gente que nunca tinha se identificado com protestos e manifestações.

Mas não volto para rua para compactuar com manifestos vazios. Não volto para rua para ficar desfilando na Avenida Paulista contra todos e contra nada ao lado de uma galera que não liga de marchar ao lado de membros do Partido Militar Brasileiro ou de Skinheads. Falta um ano para o evento mais importante do país que acontece de quatro em quatro anos e, olha só, não é a Copa do Mundo. São as eleições.

Filho meu, saia da rua, volta pro computador e estuda um pouco no que você vai fazer quando sair para votar em quem vai estar no comando do país (pode começar por aqui). E só para lembrar, sabe quem botou todo mundo que está lá agora? Pois é, fui eu e foi você também.



Edson Castro é jornalista displicente e ilustrador sem talento. Coleciona livros, cicatrizes e histórias com mulheres malucas

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