Um fenômeno se espalha com rapidez pela megalópole
paulistana: os “coxinhas”. É um fenômeno grandioso, que proporciona uma
infindável discussão. A relevância do mesmo já faz com que linguistas famosos
se esforcem em entender a dinâmica do dialeto usado por esse grupo, inclusive.
Afinal, quem são os coxinhas, o que eles querem, como esse fenômeno se
originou? O que eles são?
“Coxinha”, sociologicamente falando, é um grupo social
específico, que compartilha determinados valores equivocados. Dentre eles está
o individualismo exacerbado, e dezenas de coisas que derivam disso: a necessidade
de diferenciação em relação ao restante da sociedade, a forte priorização da
segurança em sua vida cotidiana, como elemento de “não-mistura” com o restante
da sociedade, aliadas com uma forte necessidade de parecer engraçado ou bom
moço.
Os coxinhas, basicamente, são pessoas que querem ostentar um
status superior, com códigos próprios. Até algum tempo atrás, eles não tinham
essa necessidade de diferenciação. A diferenciação se dava naturalmente, com a
absurda desigualdade social das metrópoles brasileiras. Hoje, com cada vez mais
gente ganhando melhor e consumindo mais, esse grupo social busca outras formas
de afirmar sua diferenciação.
Para isso, muitas vezes andam engomados, se vestem de uma
maneira específica, são “politicamente corretos”, dentro de sua noção deturpada
de política, e nutrem uma arrogância quase intragável, com pouquíssima
tolerância a qualquer crítica.
A Origem
Existem muita controvérsia a respeito do tema. Já foram
feitas reportagens para elucidar o mistério, sem sucesso, mas é hora de
finalmente revelar a verdade a respeito do termo.
A origem do termo “coxinha”, como referência a esse grupo
diferenciado, não tem nada de nobre. O termo é utilizado, ao menos desde a
década de 80, para se referir aos policiais civis ou militares que, mal
remunerados, recebiam também vales-alimentação irrisórios, também conhecidos
como “vales-coxinha” (os professores também recebem, mas não herdaram o
apelido).
Com o tempo, a própria classe policial passou a ser
designada, de forma pejorativa, como “coxinhas”. Não apenas por causa do vale,
mas por conta da frequência com que muitos policiais em ronda, especialmente
nas periferias das grandes cidades, acabam se alimentando em lanchonetes, com
salgados ou lanches rápidos, por conta do caráter de seu serviço.
Os policiais, apesar de mal remunerados, são historicamente
associados à parcela mais conservadora da sociedade, por atuarem na repressão
aos crimes, frequentemente com truculência. Com o a popularização de programas
policialescos como Aqui Agora, Cidade Alerta e Brasil Urgente, o adjetivo
coxinha passou a designar também toda a parcela de cidadãos que priorizam a
segurança antes de qualquer outra coisa. Para designar essa parcela que
necessita de “diferenciação” e é individualista ao extremo, foi um pulo.
Não cabe citar socialites ou coisa do tipo. São pessoas que
vivem em um mundo paralelo essas daí. Mas vou citar três criadores de tendências
no universo coxinha:
O “engraçado”: Tiago
Leifert
Uma característica importante do coxinha padrão é tentar ser
descolado, descontraído e não levar as coisas a sério. E nisso o maior exemplo
é esse figurão da foto acima. Filho de um diretor da Globo, cavou espaço na
emissora para introduzir o jornalismo coxinha na grade de esportes da Globo.
Jogos de futebol valem menos do que as piadas sem graça sobre os jogos, metade
do Globo Esporte é sempre sobre vídeo-game ou sobre a dancinha nova do Neymar,
e TUDO vira entretenimento, não esporte.
Prova disso são declarações do próprio, como a declaração em
que ele diz que não leva o esporte a sério, ou quando fala que o Brasil não é o
país do futebol, é o país da novela. Isso revela duas características do
coxinha default: ele não aceita críticas (e isso fica claro pelo número imenso
de usuários bloqueados no Twitter pelo Tiago Leifert – incluindo este que vos
escreve) e ele não tem conteúdo, provocando polêmicas para aparecer. Tudo
partindo, obviamente, da necessidade quase patológica de diferenciação.
O “bom moço”: Luciano
Huck
O apresentador, que revelou beldades como a Tiazinha e a
Feiticeira na Band, na década de 1990, virou, na Globo, símbolo do bom-mocismo
coxinha. Faz um programa repleto de “boas ações”, que, no fundo, são apenas uma
afirmação de superioridade, da mesma forma que a filantropia dos Rockfellers no
início do século XX. Puro marketing.
Quando você reforma um carro velho ou uma casa, além de
fazer uma boa ação, você se autopromove. Capitaliza com o drama alheio mostra
que, além de “bondoso”, você é diferente daquele que você está ajudando. Como preza
a cartilha do bom coxinha.
Além disso, Luciano Huck é a representação da família bem
sucedida e feliz. Casado com outra apresentadora da Globo, Angélica, forma um
dos “casais felizes” da emissora. Praticamente uma cartilha de como montar uma
família coxinha. “Case-se com alguém bem sucedido, tenha dois ou três filhos, e
leve eles para festinhas infantis junto com outros filhos de famosos”.
Para se mostrar engajado e bom moço, Huck deu até palestra
sobre sustentabilidade na Rio+20. Irônico, pra quem foi condenado por crime
ambiental, em Angra dos Reis. Ele fez uma praia particular sem autorização.
Diferenciação, novamente. Isolamento. Características típicas do coxinha
default. Assim como “ter twitter”. Mas o twitter dele é praticamente um bot, só
serve pra afagar seus amigos famosos e mandar mensagens bonitinhas.
A “Coxinha Política”:
Soninha Francine
O terceiro e último (graças a Deus) exemplo de coxinha é a
figura da imagem acima. Soninha Francine deve ser o maior caso de metamorfose
política do Brasil. Até 2006 era petista convicta, mas o vírus da COXINHICE já
afetava seu cérebro, a ponto dela sair na capa da Época em 2001 falando “eu
fumo maconha”, provavelmente por um brilhareco.
Daí ela saiu do PT, entrou no PPS, caiu nos braços de José
Serra e do PSDB paulista e se encontrou. Tenta conciliar a fama de “descolada”,
adquirida nos anos como VJ da MTV, com uma postura política típica de um
coxinha padrão: individualista e conservadora. E, pra variar, manifesta tais
posturas via… Twitter.
Emblemático foi o dia em que Metrôs BATERAM na Linha
Vermelha e ela, afogada em seu individualismo, disse que não encarou nenhum
problema e que o Metrô estava “sussa”. Assim como a acusação de “sabotagem” do
Metrô às vésperas da eleição de 2010.
Soninha ajuda a definir o estereótipo do coxinha default. O
coxinha tenta de forma desesperada parecer um cara legal, descolado e antenado
com os problemas do mundo. Mas não consegue disfarçar seu individualismo e sua
necessidade de diferenciação. Não consegue disfarçar seu rancor quando os
outros passam a ter as mesmas oportunidades e desfrutar dos mesmos serviços que
ele.
Conclusão
O coxinha é um fenômeno sociológico disseminado em vários
lugares, mas, por enquanto, só “assumido” em São Paulo (em outras cidades, os
coxinhas ainda devem ter outros nomes). Não por acaso, tendo em vista que São
Paulo é um dos ambientes mais individualistas do Brasil.
São Paulo é uma das cidades mais segregadas do país. É uma
cidade de grande adensamento no centro, com as regiões ricas isoladas da
periferia. A exclusão é uma opção dos mais ricos. Eles não querem se misturar
com o restante da população. E, nos últimos anos, isso ficou mais difícil: não
dá mais pra excluir meramente pelo poder econômico. Daí, é necessário expor um
personagem, torná-lo um padrão, pra disseminar essa mentalidade individualista
e conservadora: é aí que surge o coxinha.
E isso é bom. Porque o coxinha, hoje, é exposto ao ridículo
pelo restante da sociedade. Até algum tempo atrás, ele era apenas um personagem
latente. Ele não aparecia, portanto, não podia ser criticado ou ridicularizado.
No final, o surgimento dos coxinhas só reflete a mudança do nosso perfil
social. E, por incrível que pareça, o amadurecimento de nossa sociedade.
Fonte: Aleatório,
Eventual & Livre
Um comentário:
Se a esquerda cria estereótipos, xinga, avacalha, aí tudo bem, não é discurso de ódio. Se fazem o mesmo contra eles, aí é antipetismo, é ódio. Hipócritas.
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