Aí por volta dos anos 40 e 50, a casa do escritor Aníbal Machado, na Visconde de Pirajá, em Ipanema, era tradicionalmente aberta aos amigos, convidados e mesmos penetras, das manhãs de sábado ao entardecer de domingo.
Todo mundo compartilhava de sua hospitalidade, de Sartre e Camus aos vagabundos da esquina.
Era possível encontrar nesses saraus, no mesmo dia, Lúcio Cardoso, Otávio de Faria, Darel, Goeldi, Marcelo Grassman, Paulo César Saraceni, Paulo Autran, Tônia Carrero, Thiago de Mello, Rubem Braga, Fernando Sabino, Millôr Fernandes, pintores, escultores, arquitetos, atores, poetas, cronistas e talvez Deus pessoalmente, de papo ferrado com o capeta.
Porque a casa recendia concórdia, amizade, trégua e paixões várias.
Evidentemente, nesse bando misturado apareciam indesejáveis e tinha sempre um que particularmente desequilibrava a agitada quietude da casa com porres avassaladores.
Aníbal o suportava com a mais santa das paciências, não reclamava nunca.
Um dia, o inconveniente aparece numa manhã de segunda-feira na casa do doce escritor antropofágico. Estava sóbrio e preocupado:
– Aníbal – disse ele. “Me contaram que houve algum problema comigo aqui, no sábado: que eu tomei um porre federal e fiz alguma coisa errada. Espero não ter te ofendido”.
Aníbal, a voz calma, moderado, pretendeu consolar o visitante:
– Não, fulano – a voz esticada – de jeito nenhum. Exagero das pessoas. Você apenas evacuou no meio da sala.
Era mentira do Aníbal.
Mentira estratégica que afastou o inoportuno para sempre.
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