Cansei de dar a mão.
Havia uma modalidade de namoro ainda não catalogada: o namoro de clube. Só era
pra valer naquele pedaço. Sílvia Bisi se materializou no lago do Caixa Pará, da
Associação de Funcionários da Caixa Econômica.
As Bisi nunca foram
pequenas. Todas são grandes. Altas, audazes, voluntariosas, bonitas, sagazes,
inteligentes.
Pelo menos duas irmãs
de Sílvia já eram referência do charme e veneno da mulher paraense quando ela
me convidou para um passeio de bóia no lago da Caixa Pará – por bóia entenda
aquelas câmaras de pneu tão comuns no piscinão de Ramos.
Desde a minha infância
querida, nunca mais tinha posto a mão para valer num objeto direto e
intransitivo. É como se a roda da história tivesse girado ao contrário.
Quanto mais eu tentava
me aproximar de uma perereca, mais elas se afastavam de mim.
E aqueles namoricos de
portão podiam render muita emoção, muita rima, mas nehuma solução.
Se bronha assobiasse,
ninguém dormia na Vila Letícia. Boa parte dos meus amigos apelava para as
profissionais do amor.
Bem, entrei na bóia
sem qualquer relutância, incrédulo. Lá no meio do lago, comecei a bolinar a
Sílvia com os pés. Da margem, ninguém podia suspeitar que estava rolando a
maior sacanagem a bordo.
As Bisi são grandes,
com amplos espaços. Sílvia não fugia à regra. Garotinha, já era um mulherão. O
maiô azul-pálido se afastava nas virilhas cada vez mais à medida que meu dedão
avançava indômito, selvagem.
Eu estava tão açodado,
mas tão açodado, que quase se repete uma coisa que aconteceu com o jornalista
Tarso de Castro em pleno Florentino, no Leblon.
Ele estava namorando
Zezé Motta. E pediu que a eterna Xica da Silva fosse tirar a calcinha na frente
dele, numa daquelas quinze mesas do bar.
Ele tirou o pé do
mocassim e passou a bolinar Zezé com o dedão por baixo da mesa, é claro. O
Florentino entupido, uma hora ele deu um berro, todo mundo pensou: enfarte!
Não era, não: tinha
descolado o menisco na operação. Levado às pressas ao Miguel Couto, o don-juan
aposentou ali o dedão.
Nada grave aconteceu
ao meu novo órgão exploratório. Muito ao contrário. Não posso dizer o mesmo em
relação a uma certa região frontal.
Comecei a rondar a
casa da Sílvia a bordo do fusca de meu amigo Ronald Pastor, da mesma faixa de
idade do meu irmão.
Ronald, dono de voz
possante e criteriosa, era locutor da Rádio Nazaré. Morava numa casa na entrada
da Vila Letícia.
Gente boa, fazia o
papel de corredor cultural, trazendo do Rio as principais novidades musicais.
Foi através dele que
conhecemos João (“Chega de Saudade”) Gilberto e Juca Chaves, os discos de
musicais da televisão como Times Square (“No tempo em que eu não tinha tutu, lá
em Bangu/ Ninguém dizia I love you...”), os rocks de Sérgio Murilo e Carlos
Gonzaga, o Tamba Trio e umas operetas que ecoavam na vila, como essa versão de
Lamartine Babo para a Viúva Alegre:
Fica doido varrido
quem quer,
Quem a fundo estudar a
mulher,
Todas são uma
interrogação,
Todas são, são, são,
são,
São anjinhos sublimes
do amor,
São demônios que
causam terror...
O que não lhe dava o
direito de garfar o meu broto legal. Logo ele, que morria de medo de ser corno
– quem nunca foi que atire o primeiro chifre!
De nada adiantou a
crise de consciência em que entrou, chorando copiosamente nos ombros de meu
irmão, lá na boate Condor, o Palácio dos Bares, fincada em estacas às margens
do legendário (não se sabe por que) rio Guamá, mais pela birita que qualquer
coisa.
Naquela noite, o
palhaço Arlequim, que de tarde animava a criançada no estúdio da TV Marajoara,
Canal 2, órgão dos Diários Associados, e à noite a putada na Condor, ao sacar o
estado lastimável do locutor, mandou tocar umas três vezes, “Tortura de Amor”,
sucesso de Waldick Soriano, já estourando no Norte:
Hoje que a noite está
calma
E que a minh’alma
esperava por ti
Apareceste afinal,
Torturando esse ser
que te adora,
Volta,
Fica comigo só mais
uma noite,
Quero viver junto a
ti,
Volta, meu amor,
Fica comigo,
Não me desprezes,
A noite é nossa
E o meu amor pertence
a ti...
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