Do Jardim de Infância
me lembro muito bem de uma foto da Páscoa, todos nós sentados com um coelhinho
de papel na mão, que vale por mil aulas de genética: ninguém mudou nada na
essência, os brilhantes continuaram brilhantes – o Lúcio Flávio, irmão da
Iliaci, por exemplo –, os idiotas continuaram idiotas, e assim por diante.
Se nenhuma freira do
Colégio Santa Clara marcou minhas retinas, é sinal de que o melhor é ir frente,
direto às coxas da professora Maria de Lourdes Corrêa, entrevistas toda santa
manhã, sob uma bata branca que ia até o tornozelo.
A professora Maria de
Lourdes era uma morena baixinha de rosto lindo, seios grandes, ancas fartas e
um tremendo bundão. Lecionava no colégio Dom Amando, dos padres redentoristas,
situado numa bela colina, numa ala isolada para o pré-primario.
É bom lembrar que
esses padres tinham fama de garanhões. Um deles, o padre Jaime, teve inclusive
de voltar às pressas para os Estados Unidos depois de um romance em tudo
parecido com a história de “O Padre e a Moça”, o poema de Carlos Drummond que
virou filme de Joaquim Pedro de Andrade proibido em 1966 a pedido de dom
Agnello Rossi, então cardeal de São Paulo, incomodado com a cena em que a moça
seduz o padre.
A moça, no filme, era
Helena Ignez. Em Santarém, a professora Teresinha, irmã um pouco mais velha da
professora Maria de Lourdes. Algo certamente acabaria em happy end.
Já conhecia a professora
Maria de Lourdes da casa do meu amigo Cornélio, um dos irmãos dela. Mas a
paixão só bateu quando entrevi aquela nesga de coxas. Os irmãos da professora
Maria de Lourdes eram o creme do creme da sociedade mocoronga.
A mãe – carola de
extrema candura e simpatia – tinha perdido o marido muito cedo, usou luto
fechado por longos anos e se permitiu um black
and white básico depois de muita insistência dos filhos, uma espécie de
Kennedy Brothers no tucupi. Os Corrêa! Todos mandavam em alguma porra na cidade.
Quase matei o
Cornélio. Não raras vezes almoçava com a família dele. Depois, os mais velhos
iam direto para a sesta. De vez em quando, o Cornélio também desaparecia.
Fiquei intrigado e resolvi segui-lo pelos meandros da casa. Dei com ele no
galinheiro, dando uma na pobre galinha, quase a ponto de gozar ou coisa que o
valha. Gritei:
– Cornélio, olha a tua
mãe!
Cornélio estrebuchou
ali na hora, quase teve uma congestão, mas não teve sequelas.
Eu sonhava com a
professora Maria de Lourdes no almoço, no jantar e na merenda escolar. Se
existia uma razão para acordar, lavar a cara e sair, era a professora, que me
tratava com especial desvelo e atenção.
Acontece que a régua
ou a palmatória não desgrudavam das mãos dos mestres e eram usadas sob qualquer
pretexto. Lá um ahora, para variar, errei a taboada. Ela me sentou uma reguada
em cima da mão, e minha unha começou a sangrar.
Foi ver o sangue e
voar em cima do meu amor. Quando caí no chão, os botões da bata vieram juntos,
deixando aquela coisa toda aberta. Arremeti de novo: atraquei-me às coxas e
mordi-lhe as entrecoxas com disposição canina.
O certo é que fui
retirado dali por algo como um guindaste, as manoplas do padre-diretor. A cara
escarlate dele, em contraste com a batina branca, baixou minha crista no ato.
Não precisa dizer o
pandemônio que se instalou na classe. Soube através da minha pobre, aflita e
desmoralizada mãe, entre um e outro trampesco, a caminho de casa, que estava
expulso da escola. Aos 6 anos de idade, era realmente uma façanha.(Bem, o Primo
Altamirando, neto da Tia Zulmira, a ermitã da Boca do Mato, também logrou isso,
mas nas páginas de humor de Stanislaw Ponte Preta.)
Bonito foi meu pai
recebendo a boa nova. Como de praxe, tirou aquele cinturão com o qual eu
brincava com a Iliaci, isolou-me na sala-repartição do IAPM, bem na entrada da
casa, separada do corredor por uma porta de vaivém, como essas de saloon.
Até hoje não sei como
consegui subir numa delas. Como se estivesse montado num cavalo (a porta vai,
plaft! A porta vem, plaft!), levei a maior surra de todos os tempos.
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