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segunda-feira, julho 24, 2017

ABC do Fausto Wolff (Parte 15)


DEFOE, Daniel (1660-1731) – Não tinha nada de sacana, o autor de Robinson Crusoe, Moll Flanders, Um Diário do Ano da Peste e Coronel Jack. Também não tinha nada de puritano. Era, isso sim, um moralista no sentido mais humano do termo, além de ser um dos seis melhores escritores da língua inglesa de todos os tempos, ombreando-se com Swift, Lawrence, Gibbons, Blake, Shaw, e só não falo em Shakespeare porque também seria covardia.
Tinha um grande caráter, foi o primeiro panfletário de categoria da Inglaterra e por isso acabou curtindo um tempo de prisão. Seu crime: a ironia do panfleto The Shortest Way to the Dissenters.
“Então por que está aqui neste ABC?”, perguntará a curiosidade mórbida do leitor que quer comer cru. E eu respondo: está aqui porque, em 1724, ele escreveu um ensaio intitulado: Conjugal Lewdness, a Treatise Concerning the Use and Abuse of the Marriage Bed and Marital Whoredom.
Nele Defoe trata de um mau costume muito popular na época: os sacanas, a fim de viver sem trabalhar, raptavam jovens herdeiras que depois defloravam.
Para evitar maiores escândalos, os pais da moça faziam com que ela se casasse com o canalha que, a partir de então deixava de ter problemas sociais, econômicos e sexuais.
Quando morei na Itália (graças à Redentora) entre 1968 e 1972 (depois fui morar em Copenhague), este hábito ainda era muito comum, principalmente na Sicília, onde uma moça que não fosse virgem (mesmo que houvesse sido estuprada por um biltre qualquer) estava desonrada para sempre.
Em 1970, uma jovem raptada e deflorada, rebelou-se contra este costume e denunciou o seu raptor que, em vez de casar-se com ela, foi parar na cadeia pra ver o que era bom pra tosse.
Em compensação, a jovem teve de mudar-se da Sicília, pois por onde passava aquelas mulheres de longos bigodes e vestidas de negro comentavam: “Guarda, la violata”.
Mas voltando ao Daniel Defoe, em seu ensaio ele disse: “Me parece um absurdo que um cavaleiro possa ter a satisfação de ver pendurado na forca o ladrão do seu cavalo e não possa enforcar o ladrão da sua filha”.
Logo depois da publicação do trabalho, raptar mulheres passou a ser punível com a morte.

DEFLORAÇÃO – Ato de romper o hímen, o que permite a penetração do pênis na vagina. Falei bonito, hein? Simbolicamente significa o fim da virgindade feminina que, porém, pode acontecer também acidentalmente, ocasião em que, convenhamos, perde muito em poesia, pelo menos. Cuidado, portanto, minhas virgens, ao montarem cavalos, andarem de motocicleta por estradas cheias de buracos, colocarem o tampax, o Modess ou o OB muito lá para cima.
Eu digo “cuidado”, leitorinhas, não porque queira (como o maluco do Damiani) que vocês continuem virgens, eternamente e nem porque creia que lhes agrade se manter neste estado ou, finalmente, que pretendam guardar esta fina membrana para a noite de núpcias.
Digo “cuidado” só porque imagino que perder a virgindade do modo tradicional – aquilo naquilo – deve ser muito mais divertido.
Já houve época (ver verbete anterior) que a jovem que fosse deflorada antes do casamento era apontada na rua pela suja puritanada.
Hoje em dia o preconceito funciona ao contrário: quem morre de vergonha é a moça que chega virgem ao casamento.
Senhoras que já comi ao longo do meu quase meio século de existência informam-me que “dói um pouquinho, sangra ligeiramente, mas o prazer supera a dor”. Quem, quando garoto, já solou uma neneta para fazer a dor de dente passar, manja do riscado.
O sangue produzido pelo rompimento do hímen já foi elemento principal de muitos rituais.
Na Europa, até o princípio do século XVIII, por exemplo, o rei depois de executar a rainha com quem recém se casara, exibia pra plateia ignara um lenço manchado de sangue, prova da virilidade dele e da inocência da moça.
Também, mesmo que o sangue fosse do dedo dele, quem iria discutir? Rei mandava pacas naquelas épocas.
Durante o século passado (e até mesmo hoje em dia) muitos babacas gostavam de contar vantagens sobre o número de jovens que haviam deflorado.
Vai daí que as donas de puteiros viviam providenciando “virgens” para esses idiotas. Havia sempre um médico de plantão nos bordéis.
A “moça” era “deflorada” e assim que o cliente se retirava era imediatamente revirginizada pelo esculápio, exímio restaurador de hímens usados. No dia seguinte, lá estava a nossa “virgem” à espera de outro imbecil.
Nas sociedades mais primitivas (mais ainda?) se acreditava que as moças que perdiam a virgindade antes do casamento abriam as portas para o demônio.
Aproveitando-se da falta do hímen, os demônios entravam nas bucetas e só saíam depois de exaustivos exorcismos. Ninguém explicava por que os sacanas não entravam nas vaginas casadas quando elas estavam momentaneamente desocupadas.
Mas quem é este modesto cronista para discutir dogmas?
Alguns antigos rituais de defloração eram verdadeiros exercícios de tortura. As senhoritas transformavam-se em senhoras diante da sociedade quando o hímen delas era rompido por enormes falos de pedra, madeira, marfim ou barro. As mocinhas mais ricas recebiam, naturalmente, os de marfim.
Nataniel Jebão, presidente do Sindicato Nacional de Cronistas Sociais sem Coluna, acha isso tudo muito complicado. Segundo ele, o hímen, como a crase, não foi feito para humilhar ninguém.
“Ele está onde está – diz Jebão – para ser usado apenas no momento em que o casal quer procriar. Uma vez que o clitóris está fora do útero, para efeitos de prazer, sugiro o coito anal que, por outro lado, ou melhor, do outro lado, é um anticoncepcional natural”.
Aconselho as leitoras mais impressionáveis a não levar a sério as palavras do nefando cronista mundano.

DEFORMAÇÃO SEXUAL – Além do infinito e do nada, a única outra coisa que, creio eu, não tem limites é a estupidez humana. Desde os primórdios da civilização, por exemplo, que homens e mulheres se mutilam para se tornarem mais atraentes sexualmente.
Até a revolução de Mao Tsé Tung, na China, por exemplo, as mulheres mantinham seus pés atados fortemente por panos, a fim de que jamais ultrapassassem, por exemplo, o nº 32.
As mulheres da tribo Bogobo, das ilhas Mindanao, limam seus dentes frontais até torná-los todos pontudos.
Em outras tribos do norte da África, as mulheres, desde crianças, colocam anéis, uns sobre os outros, no pescoço, de modo a esticá-los mais que Modigliani esticava os das suas modelos.
E os índios, como o nosso Raoni, que faz o mulherio correr atrás dele por causa do disco que tem no lábio inferior!
A mulher urbana progrediu muito nas últimas décadas: mutilação mesmo só o ato de furar as orelhas. No mais, equilibram-se sobre tacos que podem ir até quinze centímetros e lambuzam a cara todos os dias.
Os homens põem fumaça para dentro dos pulmões, através de pequenos caralhinhos de papel cheios de fumo, e usam um pedaço de pano no pescoço que ninguém sabe para o que serve.

Mutilação só os punks (apedeutas que não têm nada dentro da cabeça e por isso precisam colorir os cabelos), que gostam de enfiar argolas no nariz, e os judeus, que cortam um pedaço da pele do pau das suas crianças logo depois que elas nascem.

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