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sábado, dezembro 14, 2019

Caboco Sete Flechas não é fácil não, zifio!



Abril de 1962. Dia de São Jorge. Os terreiros de candomblé, umbanda e quimbanda estão em festa porque, na tradição religiosa afro-brasileira, Ogum é frequentemente identificado com São Jorge.

Os jovens playboys Odivaldo Guerra e Divaldo Martins resolvem esticar o espinhel no Templo de Umbanda Cacique Ubiratã, do babalorixá Pai Evaldo, localizado em Santa Luzia, bairro separado da Cachoeirinha pelo igarapé do Quarenta.

Bastava pegar uma catraia no final da Rua Maués para atravessar o igarapé.

As filhas-de-santo de Pai Evaldo eram consideradas as devotas de Ogum mais bonitas da cidade.

No começo da madrugada, logo após o encerramento dos festejos, Divaldo Martins consegue fisgar uma bonita filha-de-santo e avisa pra Odivaldo Guerra esperá-lo no porto da catraia da Rua Maués, que ele não demora.

O casal sai caminhando naquela escuridão de breu, quase no meio de uma verdadeira mata fechada, em busca de um santuário para deixar a natureza seguir seu curso.

Depois de uns quinze minutos de pernada, eles conseguem divisar uma imensa pedra polida, cor de chumbo, no meio do capinzal. Divaldo coloca a garota sobre a pedra polida, na posição vaca atolada, e manda brasa.

No meio do vai-e-vem, a menina começa a tremer freneticamente e estrebuchar. Divaldo supõe que ela está tendo um orgasmo selvagem e aumenta a velocidade do motor de popa. Nisso, uma voz soturna, quebra o silêncio da madrugada:

– Suncê num tá me furufando não, zifio, que sou caboco macho! Suncê tá furufando é ela, a mia zifia! Caboco Sete Flechas num dá mole não, zifio, só te digo isso!… Caboco Sete Flechas é sujeito hômi, num é baitola não, nem com nojo!… Tu vai já vê o que vou fazê com suncê!… Vou colocá um sapo cururu no teu bucho, que tu vai levá seis anos pra levantá o piru de novo… Se esse estrupiço num cair de podre antes da lua cheia… Tu vai vê só, zifio, tu vai vê só!… Pra aprendê a respeitá Caboco Sete Flechas e a zifia dele… Suncê num perde por esperá...

Divaldo levou alguns segundos para perceber que a filha-de-santo havia acabado de incorporar o Caboco Sete Flechas e menos tempo ainda para broxar de vez.

Nervosíssimo, ele se desgruda da menina e sai correndo pelo mato, trombando em árvores, caindo no terreno úmido, se levantando, e tornando a correr, até conseguir chegar no porto de catraia, onde Odivaldo Guerra já o esperava com certa impaciência.

Divaldo está com cara de quem viu visagem e não gostou, o coração quase saindo pela boca. Pior: na correria, perdeu uma pulseira de ouro, presente de sua madrinha. 
Ele relata ao parceiro o sucedido e os dois picam a mula, no rumo da Cachoeirinha.

No dia seguinte, por volta das 10h da manhã, Divaldo e Guerra retornam ao local do crime para procurar a pulseira. 
Depois de meia hora embrenhados no meio do mato, Divaldo reconhece a pedra polida.

Quando se aproximam percebem que a pedra polida, na verdade, era uma lápide abandonada. A pulseira está caída ao lado da lápide.

Só então caiu a ficha: Divaldo e a filha-de-santo haviam entrado, sem querer, no Cemitério Santa Helena, que nessa época não era murado.

Os dois playboys nunca mais quiseram saber de paquerar filhas-de-santo em terreiros de umbanda.

O Caboco Sete Flechas não é fácil não, zifio!

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