Agosto de 1982. O sambista
Martinho da Vila desembarca em Manaus, a convite do GRES Vitória Régia, para
fazer um show exclusivo na quadra da escola. Durante um mês, um carro volante
alugado pela escola verde-e-rosa percorreu todos os bairros da cidade
anunciando o espetáculo do renomado partideiro de Vila Isabel, que havia
acabado de lançar um novo disco (“Verso e Reverso”). A previsão dos dirigentes
da escola era de “casa cheia”.
Faltando algumas horas
para começar o show, ainda no hotel, Martinho da Vila chama um de seus
assessores em particular e avisa que está precisando fumar um cigarro de índio
para relaxar um pouco antes de dar início à cantoria. O sujeito dispara meia
dúzia de telefonemas, aí embarca o pagodeiro em um táxi e os dois seguem para a
casa do Chico Padeiro, na Cachoeirinha, localizada na Rua General Glicério,
quase canto com a Rua Parintins. Chico Padeiro era reputado como fornecedor da
melhor erva maldita da região.
Os dois são recebidos na
varanda da modesta residência pelo próprio Chico Padeiro, que os trata com
distinção e cortesia. Feitas as apresentações iniciais e o motivo da visita,
Chico Padeiro entra na casa e retorna, depois de alguns minutos, trazendo uma
pequena mala de couro. Martinho da Vila está se balançando em uma cadeira de
macarrão na varanda bastante ventilada. Chico Padeiro abre a pequena mala aos
pés de Martinho da Vila. Ela está abarrotada de maconha até a boca.
– Pode fazer uma presença
pra saber se o produto é bom! – explica timidamente Chico Padeiro.
Martinho da Vila mete a
mão na mala, pega um pouco de erva, tira do bolso um papel de seda, faz o
“finório”, coloca o cigarro na boca, acende, dá uma, duas, três tragadas de
responsa, com sofreguidão, prende a respiração e fica esperando o tapa da
pantera.
O sambista não deve ter se
decepcionado porque, na sequência, como se ainda fosse um gourmet saboreando o
buquê de um vinho raro, avisa, peremptório:
– A mala é minha! A mala é
minha!
Pronto. O show na quadra
da escola foi pras cucuias porque o sambista não se levantou mais da cadeira de
balanço. A multidão enfurecida pelo súbito cancelamento da apresentação do
artista teve de ser contida à força pela Polícia de Choque.
Indiferente ao quiproquó
que se desenrolava na Praça 14, Martinho da Vila passou o resto da noite
degustando a maconha de qualidade mundial vendida pelo Chico Padeiro. Culpa da
varanda bastante ventilada, que se convertia em oásis durante um dos meses mais
quentes do ano. Choses.
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