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quinta-feira, dezembro 12, 2019

O invocado Louro do Pezão



Em pé: Julio Almeida, Kepler Evandro (“Kepelé”), Petrônio Aguiar, Almir Português, Walter Doido, Heraldo Cacau, Gilmar Velhote, Simão Pessoa, Chico Porrada e Mestre Louro. Agachados: Gilson Cabocão, Nilton Torres, Marco Aurélio, Luiz Lobão, Azamor Bobô e Carlito Bezerra

Brilhante meia-armador do Náutico (onde jogou ao lado de Sici Pirangy, Luiz Lobão e Manuel Augusto) e do fabuloso Murrinhas do Egito (onde jogou comigo, Luiz Lobão e Petrônio Aguiar), o endiabrado Marco Aurélio foi outro excelente jogador de futebol da Cachoeirinha que nunca quis jogar profissionalmente.

Seu negócio era jogar sinuca. Chegou a participar de campeonatos no sul do país, enfrentando feras como Carne Frita e Rui Chapéu. Ficou conhecido como Louro do Pezão.

Em março de 1978, numa tarde de sábado, quando ainda estava em casa se preparando para um jogo do Náutico pelo campeonato amador, Marco Aurélio foi surpreendido pela chegada intempestiva de Nei Parada Dura.

– Meu parceiro, descobri um monte de patos pra você depenar! – disparou Nei Parada Dura. – Pega teus tacos e vamos lá fazer a feira!

– Pô, Nei, hoje não vai dar não, porque daqui a pouco eu vou fazer um jogo decisivo pelo Náutico… – explicou Marco Aurélio.

– Qualé, parceiro? No Náutico você não ganha um tostão. Sois agora um novo milionário que não gosta mais de ganhar dinheiro não, é?… – devolveu Nei Parada Dura. – Deixa de onda, rapá, que eu vou apostar no teu taco. Nós dois vamos lavar a burra porque não é todo dia que a gente encontra leite de pato dando sopa…

Diante de argumentos tão convincentes, Marco Aurélio apanhou sua caixa de tacos desmontáveis, embarcou no carro de Nei Parada Dura e os dois se mandaram para um boteco localizado em Petrópolis, nas proximidades do Batalhão da Polícia Militar.

Uns 20 sujeitos estavam no boteco jogando “carambola”, na modalidade ganha-chama: partidas individuais, um contra um, quatro bolas vermelhas contra quatro bolas amarelas, com todas as bolas funcionando como “ponteiras”.

As bolas são armadas no campo de cada jogador. Duas bolas coladas na parte horizontal da sinuca e uma bola colada em cada lado vertical da mesa. Cada um joga uma vez. Se matar uma bola, continua jogando. Se errar, cede a vez ao outro. Vence quem primeiro encaçapar todas as bolas do adversário.

Enquanto bebiam uma cerveja, Marco Aurélio e Nei Parada Dura ficaram apenas observando o jogo dos sujeitos.

Os jogadores eram mesmo amadores. Na maioria das vezes, se limitavam a atacar e defender com as duas bolas das verticais, cada qual empurrando a bola do adversário para a caçapa mais próxima.

Umas dez rodadas depois, o sujeito que havia vencido a partida perguntou se eles não queriam participar do jogo. A “casada” era de R$ 20 por cabeça. Nei Parada Dura disse que ia apostar no taco de seu amigo. A aposta foi casada.

Marco Aurélio abriu a caixa de ferramentas, atarraxou um taco especial com ponta de sola francesa, passou giz na ponta do taco e entrou no ringue.

Na primeira jogada que fez, ele meteu um efeito tão invocado na sua ponteira que simplesmente descolou todas as quatro bolas do adversário.

Na segunda jogada, matou uma por uma todas as bolas.

Aboletado em uma mesa a poucos metros da sinuca, um aleijadinho, que aparentemente era o líder da turma, ficou encrespado.

Enquanto pagava a casada para Nei Parada Dura, ele lançou o desafio:

– Isso é sorte de amador. Eu quero ver o seu amigo derrotar o Crispim. E também quero dobrar a casada!

Nei Parada Dura topou o desafio.

Eu e o Louro do Pezão no Bar do Jacó

Crispim entrou na mesa e Marco Aurélio, que como havia vencido a partida anterior tinha direito à primeira tacada, repetiu a brincadeira.

As quatro bolas do sujeito foram descoladas como num passe de mágica.

Crispim deu apenas uma tacada, tentando defender uma de suas bolas que estava quase na caçapa.

Na segunda tacada, Marco Aurélio matou uma por uma todas as bolas do sujeito.

Cada vez mais puto, o aleijadinho ia convocando sua tropa de choque (Militão, Zé da Burra, Onofre, Palhinha, Baiano, Mundico, Sarará, Magaiven, Ceará, Benedito, Sabazinho e o diabo a quatro), enquanto Marco Aurélio ia jantando um por um e Nei Parada Dura não parava de ganhar dinheiro.

Lá pela vigésima partida, o aleijadinho não se conteve.

Ele se levantou da sua mesa e saiu andando apressadamente, com uma das pernas balançando no estilo “deixa-que-eu-chuto”, em direção à sinuca.

Aí, se debruçou sobre a mesa pelo lado oposto ao de Marco Aurélio, que pacientemente passava giz na ponta do taco esperando um novo adversário.

O aleijadinho olhou para o chão, mediu mentalmente a sandália Franciscana do jogador, depois olhou para a cara de Marco Aurélio, balançou a cabeça afirmativamente como se dissesse “é você, né, seu filho da puta?” e gritou para seus comandados, que também estavam passando giz nas pontas dos tacos cada vez mais dispostos a se vingar das derrotas humilhantes:

– Podem parar! Podem parar! Esse desgraçado aqui é o Louro do Pezão, que já derrotou até o Rui Chapéu… Ele é jogador profissional e vai nos comer pelas canelas até a gente ficar completamente liso…

Antes que Marco Aurélio abrisse a boca, Nei Parada Dura já estava lhe enfiando dentro do carro e caindo fora do boteco, levando no bolso mais de R$ 800 de “leite de pato”.

O Louro do Pezão era foda.

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