Pesquisar este blog

segunda-feira, dezembro 23, 2019

Demonstração da arte suave no Bar Pinguim



Ivancy Wilkens e seu irmão Xireia

Março de 1978. Estudante do Colégio Brasileiro e morador da Vila Mamão, Ivancy Wilkens, primo do advogado Val Wilkens, tinha 15 anos e estava gazetando aula para jogar pinball no anexo do Bar Pinguim, chamado “Pinguinzinho”, ali na Praça do Congresso.

Ele estava jogando em uma máquina Taitorama, que permitia o jogo simultâneo de até quatro moleques porque possuía marcadores individuais.

Quando perdeu a terceira bola e ia dar a vez a outro jogador, a máquina anunciou que ele havia conquistado um bônus extra, que lhe dava direito à nova partida.

Um sujeito grandalhão que aguardava sua vez de jogar cismou que o bônus extra era dele e expulsou Ivancy da máquina, com violência.

Ivancy ficou ali por perto, curtindo sua raiva em silêncio e, de repente, quando o sujeito menos esperava, ele se aproximou sorrateiramente e deu um pisão violento na máquina.

O solavanco obrigou a máquina a fazer “tilt”, ou seja, “the game is over”.

O sujeito ficou furioso por ter perdido a ficha e avançou sobre Ivancy para dar-lhe umas porradas.

Ivancy saiu correndo do anexo e entrou no Bar Pinguim, com o grandalhão em seu encalço.

Foi quando outro sujeito se interpôs entre os dois:

– Deixa o moleque em paz e procura um cara do teu tamanho pra brigar! – disparou o sujeito, que era bastante franzino.

– Tu não te mete, senão quem vai apanhar é você! – devolveu o grandalhão.

– Então vem pra cima! – desafiou o franzino.

O grandalhão deu um soco, o sujeito franzino se desviou, pegou o pulso do oponente e lhe jogou no chão, em uma fração de segundos.

Mais puto ainda, o grandalhão se levantou, deu um novo soco, o franzino fez uma nova esquiva, pegou no pulso do adversário e colocou o sujeito no chão pela segunda vez, em outra fração de segundos.

O grandalhão não se deu por vencido.

– Aguenta aí que eu vou bem ali chamar a minha turma e nós vamos te quebrar de porrada! – avisou, saindo correndo do bar em direção à Praça da Saudade.

Ainda apavorado, Ivancy foi lá com o sujeito que lhe salvara da surra:

– Meu amigo, obrigado por tudo, mas acho bom o senhor se mandar. Aquele cara que o senhor derrubou no chão é um valentão aqui da área conhecido como Short. A turma que ele foi buscar só tem maus elementos: De Ouro, Brecha, Careca, Dodô, Exu, Rai Maraca, Afonsinho...

– Pode deixar que eu sei me cuidar! – avisou o sujeito franzino, enquanto bebia tranquilamente um novo chopinho.

Cada vez mais nervoso, Ivancy foi pra frente do Ideal Club observar a confusão à distância.

Dali a alguns minutos surgiu a turma do invocado De Ouro, disposta a matar ou morrer por um de seus membros.

– Foi aquele filho da puta ali que me bateu! – avisou Short, apontando para o sujeito franzino, que permanecia encostado no balcão da choperia sorvendo tranquilamente seu chopinho.

De Ouro falou alguma coisa com o sujeito e, dali a pouco, os dois estavam encarando alegremente várias tulipas de chope, como velhos amigos.

O resto da turma, incluindo Short, foi embora.

Sem entender nada, Ivancy se aproximou timidamente do balcão do bar.

– Foi esse moleque aí que começou a confusão? – perguntou De Ouro.

O sujeito franzino assentiu com a cabeça.

– Chega aí, moleque! Vem tomar um chopinho com a gente! Esse aqui é o meu professor Reyson Gracie, o cara que introduziu o jiu-jítsu no Amazonas – avisou De Ouro.

Só então a ficha caiu. Aquele sujeito franzino era simplesmente o terceiro filho do lendário Carlos Gracie, considerado o pai do jiu-jitsu brasileiro.

Reyson chegou em Manaus, em 1976, a convite de seu amigo Artur Neto, para difundir o jiu-jitsu.

No ano seguinte, fundou a federação amazonense da modalidade e realizou o primeiro campeonato oficial da arte suave no ginásio do Colégio Militar de Manaus.

Ivancy Wilkens, Simão Pessoa, Simas Careca Selvagem e Xireia

Naquela mesma tarde do entrevero no Bar Pinguim, Reyson Gracie convidou Ivancy para treinar com ele, no próprio quarto de hotel em que estava hospedado, na Rua dos Barés.

Os ensinamentos obtidos com Reyson eram transferidos por Ivancy para seu irmão caçula, Joaquim Nogueira Neto (aka “Xireia”), na época um pivete de oito anos.

Ele ganhou esse apelido jogando futsal no time infantil do ABC porque lembrava muito o líbero Gaetano Scirea, campeão pela seleção italiana de 1982.

Artista plástico, muralista e entalhador, Xireia foi campeão adulto de futsal Norte-Nordeste pelo ABC, mas depois abandonou as quadras para se dedicar ao jiu-jitsu.

Atualmente é trabalhador da Samsung, no Distrito Industrial.

Ivancy, além de se dedicar ao jiu-jitsu, foi campeão amazonense de voleibol pelo Olímpico.

Atualmente, ele mexe com fretamento de barcos para festas regionais.

O irmão mais velho dos dois, João Nogueira (aka “Nogueira”), em parceria com a esposa Ana, mantém estoicamente, e apenas com recursos próprios, a escola de futebol Meninos da Vila Mamão, que ensina os fundamentos do rude esporte bretão para cerca de 70 moleques de 7 a 14 anos, em um campinho de areia localizado na Rua Vasconcelos Chaves, próximo de sua residência.

Líbero do time de másters do Santos, de São Francisco, Nogueira trabalha no setor de logística de uma empresa terceirizada da Gol Transportes Aéreos.

Tudo índio, tudo parente, tudo sangue bom!

Nenhum comentário: